O Ministério da Economia montou um grupo de trabalho para avaliar o fechamento das fábricas da Ford no país e está entrando em contato com outras montadoras sobre a possibilidade de elas assumirem as unidades da marca.
Presidentes e outros executivos de três fabricantes mundiais já foram acionados pelo governo federal para buscar um destino para as fábricas de Camaçari (BA), Taubaté (SP) e da Troller em Horizonte (CE).
Segundo membros do governo ouvidos pela reportagem, é possível que uma fabricante chinesa assuma ao menos uma das unidades. Apesar de os nomes serem mantidos em sigilo, é mencionado em conversas como uma possível candidata a Chery.
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A marca chinesa já tem no Brasil uma operação em parceria com a brasileira Caoa, mas a avaliação é que sua produção atualmente ainda é pequena no país. Ela não está sequer entre as cinco marcas com mais veículos vendidos em território nacional, e a visão entre integrantes do governo é que ela poderia ganhar força com uma expansão a ponto de incomodar os concorrentes.
A tendência é que o governo continue entrando em contato com empresas para obter um número relevante de interessados, uma medida que também foi colocada em prática pelos governos de São Paulo e Bahia. Mas a equipe econômica ressalta que a decisão de entrar nas fábricas é uma decisão das companhias e que dependerá da estratégia de cada interessado.
Membros do Ministério da Economia defendem que a decisão da Ford de sair do país não é uma notícia boa, mas que deve ser entendida mais como um reposicionamento da marca no atual cenário global do que exatamente na operação do Brasil.
Integrantes do time reconhecem nos bastidores que este é o segundo caso similar em menos de um mês. A Mercedes-Benz anunciou o fechamento de sua única fábrica brasileira de veículos leves, em Iracemápolis (SP), no fim do ano passado.
Em ambos os casos, integrantes do Ministério ressaltam que os movimentos são estratégias particulares de cada empresa para enxugamento de custos e foco em produtos mais rentáveis.
Múltiplos fatores são citados, como o reposicionamento global das marcas, as mudanças trazidas pela tendência dos carros elétricos, a competição estimulada pelos fabricantes asiáticos e o impacto nas vendas provocada pela Covid-19.
Mas o elemento mais importante mencionado é o custo Brasil, que estimula as empresas a buscarem alternativas de negócio mais rentáveis. Entidades como Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), CNI (Confederação Nacional da Indústria) e Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) corroboram essa visão.
Os membros da equipe econômica trabalham com uma lista de fatores que impulsionam o custo Brasil. O principal deles é o capital humano, que seria pouco capacitado e exige qualificações pagas pelas empresas. A lista segue com sistema tributário, infraestrutura e insegurança jurídica.
O presidente da Ford América do Sul, Lyle Watters, havia dito em comunicado em dezembro que os desafios enfrentados pelo setor automotivo incluíam, além da redução significativa dos níveis de vendas e produção, a desvalorização do real. Segundo ele, isso aumenta os custos de se atuar no Brasil.
Segundo Watters, a expectativa era que a atividade econômica na América do Sul se recuperasse gradualmente em 2021, mas com o retorno de produção e vendas vistas em 2019 somente em 2023.
A equipe econômica afirma que subsídios não faltaram ao setor, após decisões tomadas em diferentes governos. Os incentivos tributários ao setor automotivo serão de R$ 5,9 bilhões de 2021, segundo cálculos da Receita Federal que embasaram a proposta de Orçamento para este ano.
Exemplo disso foi o Rota 2030, programa de incentivos à indústria automotiva criado em 2018 que tinha como justificativa ampliar a inserção global da indústria automotiva brasileira através da exportação de veículos e autopeças. A medida tinha custo fiscal projetado de R$ 3,7 bilhões na soma de 2019 e 2020.
Gustavo Ene, secretário do Desenvolvimento, Indústria, Comércio, Serviços e Inovação do Ministério da Economia, diz que o Rota 2030 acabou compensando os custos da indústria e atraiu investimentos no Brasil, principalmente voltados a veículos mais modernos. "É muito mais caro fazer carro no Brasil, o que mostra como o nosso ambiente de negócios é sufocado", afirma.
Apesar disso, ele afirma que subsídios como esse, criado em governos anteriores, deveriam ter sido acompanhados de outras mudanças para melhorar o ambiente de negócios. "Eles foram feitos para compensar o custo Brasil, mas os governos passados não avançaram em reavaliar as causas que levaram a esses incentivos", disse.
Ele diz que o governo atual tem como meta a redução dos custos das empresas, mas diz ser fundamental também a atuação do Congresso para aprovação de medidas como novas leis para os mercados do gás, das ferrovias, da cabotagem e a reforma tributária.
Carlos da Costa, secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, afirmou que o atual governo assumiu com uma indústria em frangalhos, apesar de bilhões gastos anteriormente, e que o Executivo tem atuado para reduzir o custo Brasil. Segundo ele, no entanto, a pandemia impediu que as ações surtissem efeito a tempo.
"É hora de unirmos forças para avançar ainda mais rápido na redução do custo Brasil e recuperar nossa indústria, que perdeu espaço no PIB em todos os governos anteriores", afirmou Costa em rede social.
Em nota, o Ministério da Economia lamentou a decisão global da Ford de encerrar a produção no Brasil e disse que o movimento destoa da "forte recuperação observada na maioria dos setores da indústria no país, muitos já registrando resultados superiores ao período pré-crise".
"O ministério trabalha intensamente na redução do custo Brasil com iniciativas que já promoveram avanços importantes. Isto reforça a necessidade de rápida implementação das medidas de melhoria do ambiente de negócios e de avançar nas reformas estruturais", afirma a pasta.