A alta do preço de commodities nos mercados internacionais está anulando os benefícios que a valorização do real poderia trazer para a queda da inflação e do preço de alimentos e combustíveis neste ano.
No geral, a balança ainda pesa a favor da inflação. Ou seja, o aumento no preço desses produtos no exterior supera a melhora no câmbio no Brasil neste ano.
Além disso, prevalece a avaliação de que a tendência para o real até o final do ano é de desvalorização, enquanto os preços das commodities tendem a continuar em patamar elevado. Por isso, as projeções de inflação para 2022 continuam se deteriorando.
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O dólar comercial fechou nesta quarta-feira (23) vendido a R$ 5,003. É a menor cotação da moeda americana desde 30 de junho de 2021.
O real é a moeda que mais se valorizou neste ano entre as maiores economias, mas ainda é uma das que mais se depreciou desde 2020.
No caso do petróleo, os dados mostram um empate nas variações em fevereiro, mas um efeito inflacionário desde o início do ano.
Por isso, o preço da gasolina nas refinarias brasileiras continua com uma defasagem em torno de 10% em relação ao valor na Bolsa de Valores dos EUA, de acordo com cálculo do Banco Original.
Ou seja, com base apenas no critério de preço, a Petrobras não teria motivo para reduzir o valor do combustível neste momento, mesmo com a valorização do real.
A Petrobras adota uma política de paridade de preços para os derivados do petróleo no mercado interno em relação aos valores internacionais, que considera também fatores como o câmbio.
Daniel Xavier, coordenador do Departamento Econômico do Banco ABC Brasil, calcula que em 2022 o resultado líquido de alta de commodities e queda do dólar ainda é inflacionário.
A apreciação cambial de 8,1% observada até agora tende a retirar cerca de 0,9 ponto porcentual do IPCA (índice oficial de inflação do país) em quatro trimestres. A valorização de 24% do petróleo Brent tem impacto inflacionário de 1,6 ponto no mesmo período. O aumento de 10% no preço das commodities agrícolas em dólares acrescenta 0,2 ponto ao índice de inflação. A alta de 0,4% das commodities metálicas tem efeito praticamente zero.
A somatória desses impactos estimados até agora sobre o IPCA é de 0,9 ponto para cima no horizonte de quatro trimestres, segundo o economista, que projeta inflação de 5,7% neste ano.
Segundo ele, nas últimas semanas o dólar perdeu força frente ao real, o que de certa forma "compensou" a pressão que vem do barril de petróleo no momento. Mas o cenário pode mudar.
"O consenso do Focus para o IPCA 2022, hoje em 5,56%, tende a ser revisado para cima. Em função, principalmente, da perspectiva mais desfavorável para a cotação do petróleo, que é a commodity com maior impacto marginal sobre a inflação doméstica e segue marcada por incertezas geopolíticas neste início de ano."
O economista-chefe do Banco Original, Marco Caruso, afirma que, desde a última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central, no começo do mês, tanto o real quanto o barril de petróleo tiveram valorização em torno de 8%.
Na época, o BC adotou um câmbio de R$ 5,45 (média das semanas anteriores), e o barril estava no patamar de US$ 89. Agora, os valores são de cerca de R$ 5,00 e US$ 97, respectivamente.
Ele diz que o benefício do câmbio para a inflação pode ser menor que o estimado, pois as desvalorizações cambiais exercem muito mais pressão para cima no IPCA do que as valorizações exercem para baixo na inflação.
Se uma variação de 10% para cima no dólar coloca cerca de 1 ponto no IPCA, como estimado pelo Banco
Central, uma queda na mesma magnitude tira apenas 0,30 ponto da inflação, afirma o economista.
Caruso calcula uma redução efetiva do índice de preços de apenas 0,25 ponto percentual para uma apreciação de 8% na moeda brasileira. Sua projeção de IPCA de 5,8% para este ano, no entanto, considera um câmbio de R$ 5,85 no final de dezembro.
"É mais fácil subir preços em uma desvalorização cambial do que reduzir em uma eventual valorização", afirma Caruso. "Se eu fosse o BC, não daria um grande peso ao câmbio para eventualmente sinalizar uma pausa mais cedo na alta da Selic."
Rodrigo Leão, coordenador técnico do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), afirma que dólar e petróleo tiveram variações praticamente da mesma magnitude desde o último reajuste da Petrobras.
Para ele, seria necessário trazer o dólar para perto de R$ 4,00 para que fosse tecnicamente justificável uma redução no preço dos combustíveis no Brasil com base no critério de paridade de preços.
Segundo Leão, enquanto o mercado projeta alta do dólar ainda neste ano, as expectativas para o petróleo são de manutenção do preço em patamar elevado.
"A gente está com um cenário externo bastante instável por causa de Rússia e Ucrânia. Na melhor das hipóteses, vamos ter um preço [do barril] no patamar que está agora. Não acredito que vá ficar mais baixo."
Isso não significa que os combustíveis irão necessariamente subir neste ano. Ele afirma que questões políticas relacionadas à eleição no Brasil podem contribuir para uma alta do dólar, mas também colocariam pressão sobre a Petrobras para não fazer novos reajustes.
Questionado há cerca de dez dias sobre novos ajustes nos preços dos combustíveis, diante da tensão entre russos e ucranianos, o presidente da Petrobras, general da reserva Joaquim Silva e Luna, afirmou estar "acompanhando o que está acontecendo".
A estatal fez seu último reajuste em 11 de janeiro, de 8% nos preços do diesel nas refinarias, enquanto a gasolina vendida às distribuidoras teve alta média de 4,85%.