A rede social X, do empresário Elon Musk, acusou o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), de ameaçar de prisão seus funcionários e, diante disso, anunciou o fechamento do escritório no Brasil.
O anúncio neste sábado (17) foi feito pela própria rede X, antigo Twitter. A empresa afirma na postagem que vai encerrar suas operações no país em decorrência da ação do ministro, mas que a rede social continuará disponível para os brasileiros.
Em sua conta, Musk disse que a "decisão de fechar o escritório X no Brasil foi difícil". "Se tivéssemos concordado com as exigências de censura secreta (ilegal) e entrega de informações privadas de @alexandre, não haveria como explicar nossas ações sem ficarmos envergonhados."
"Não há dúvidas de que Moraes precisa sair. Ter um 'justiceiro' que viola a lei repetidamente e flagrantemente não é justiça nenhuma", afirmou em outra postagem.
O STF foi procurado pela reportagem no início da tarde deste sábado (17), mas ainda não se pronunciou sobre o caso.
Em comunicado, a plataforma afirmou: "Apesar de nossos inúmeros recursos ao Supremo Tribunal Federal não terem sido ouvidos, de o público brasileiro não ter sido informado sobre essas ordens e de nossa equipe brasileira não ter responsabilidade ou controle sobre o bloqueio de conteúdo em nossa plataforma, Moraes optou por ameaçar nossa equipe no Brasil em vez de respeitar a lei ou o devido processo legal".
"Como resultado, para proteger a segurança de nossa equipe, tomamos a decisão de encerrar nossas operações no Brasil, com efeito imediato. O serviço X continua disponível para a população do Brasil."
"Estamos profundamente tristes por termos sido forçados a tomar essa decisão", acrescentou, dizendo que "a responsabilidade é exclusivamente" de Moraes. "Suas ações são incompatíveis com um governo democrático. O povo brasileiro tem uma escolha a fazer: democracia ou Alexandre de Moraes."
A rede social publicou o que seria decisão sigilosa de Moraes na qual ele determina a intimação dos advogados regularmente constituídos pela X no Brasil para que tomem as providências necessárias e cumpram em 24 horas decisão anterior, bloqueando conta de usuários da rede.
Caso isso não ocorra, afirma o texto, será decretada a prisão da administradora da empresa, Raquel de Oliveira Villa Nova Conceição, por desobediência à determinação judicial. Ela ainda seria afastada da direção da companhia e multada em R$ 20 mil por dia. A partir de agora, sem a representação no Brasil, as notificações e eventuais sanções ficam mais difíceis.
Na decisão judicial publicada pela empresa, Moraes narra a tentativa do oficial de Justiça de comunicação com a rede social, para que cumprisse outra determinação, de bloqueio de contas de usuários, do dia 7 deste mês. Aplicou então multa de R$ 50 mil e intimou quem acreditava ser o administrador da empresa no Brasil, Diego de Lima Gualda.
Posteriormente, narra, tomou conhecimento de que Gualda não era mais o representante da empresa no Brasil. O oficial de Justiça teria entrado em contato com uma profissional de relações públicas da empresa, que pediu a formalização da demanda por email.
Após isso, recebeu a informação de que a nova representante jurídica seria Raquel de Oliveira Villa Nova Conceição. Houve a recusa de fornecer o contato da diretora. Tentou contato por email, sem retorno. O oficial ainda narra, segundo a decisão, que não foi possível realizar a diligência in loco, pois a representante da empresa estaria em outro estado.
"O teor da certidão elaborada pelo oficial de Justiça indica que a representante da empresa X Brasil Internet Ltda., Raquel de Oliveira Villa Nova Conceição, agindo de má-fé, está tentando evitar regular intimação da decisão proferida nos autos, inclusive por meio eletrônicos, da qual já demonstrou ter conhecimento, com o fim de frustrar o seu cumprimento", escreveu Moraes na decisão divulgada.
O encerramento das operações do X no Brasil pode dificultar ainda mais o cumprimento de decisões judiciais, uma vez que não haverá representantes para serem notificados.
A situação pode se assemelhar a casos recentes de outras plataformas, como o Telegram, que vinha escapando de ordens e pedidos de autoridades brasileiras, inclusive do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do STF, que faziam tentativas de contato sobre demandas envolvendo publicações na rede social, no período eleitoral.
A reportagem depois revelou que o Telegram tinha um representante no Brasil, para tratar de assuntos de propriedade intelectual.
Existe a possibilidade de uma decisão judicial mais drástica, como a derrubada da plataforma no Brasil -que seria executada pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). No entanto, como o X tem sua base no exterior, usuários poderiam acessá-lo usando um VPN, para contornar as restrições.
Nesta semana, Moraes decidiu aumentar a multa e indicou possível responsabilização do X pelo crime de desobediência.
No dia 8 de agosto, ele havia determinado que a plataforma bloqueasse sete contas na rede social, incluindo a do senador Marcos do Val (Podemos-ES). O X, porém, não cumpriu a decisão judicial e já tem mais de R$ 300 mil em multas a pagar à Justiça.
Havia nos bastidores apreensão pelos impactos no curto prazo da possível configuração de crime de desobediência. O prazo para o X recorrer da decisão de Moraes termina no início da próxima semana.
Em 2023, uma disputa semelhante quase levou à retirada do ar do aplicativo de mensagens Telegram.
O app era investigado no inquérito das fake news e não tinha representação legal no Brasil. Moraes então determinou que a empresa indicasse representação no país em até 24 horas, sob pena de o app ser retirado do ar.
No caso do X, Musk encabeçou uma ofensiva pública contra Moraes em abril. O caso teve início com a divulgação do "Twitter Files Brazil", conteúdo que reuniu emails trocados por funcionários da rede entre 2020 e 2022 reclamando de decisões da Justiça brasileira no âmbito de investigações sobre a propagação de notícias falsas e ataques ao sistema eleitoral.
O empresário intensificou críticas ao magistrado no X, o acusou de ordenar censura e ameaçou descumprir decisões judiciais.
Com a repercussão dos documentos, uma comissão dos Congresso dos EUA pediu à rede social que enviasse todas as decisões sigilosas de Moraes que pedissem a suspensão ou a remoção de perfis.
Os congressistas divulgaram uma lista com 77 decisões do ministro sobre derrubada de perfis em 2022 -em alguns casos, as contas dizem respeito à mesma pessoa, mas em diferentes plataformas.
Na ocasião, o STF divulgou nota oficial declarando que o relatório do Congresso dos EUA tinha somente os ofícios enviados às plataformas para cumprimento da decisão. Era uma resposta às críticas pela falta de fundamentação para os bloqueios das redes.
"Fazendo uma comparação, para compreensão de todos, é como se tivessem divulgado o mandado de prisão (e não a decisão que fundamentou a prisão) ou o ofício para cumprimento do bloqueio de uma conta (e não a decisão que fundamentou o bloqueio)", disse o Supremo.