Depois de um ano marcado pela tragédia climática no Rio Grande do Sul, queimadas recordes no pantanal e seca histórica na amazônia, o governo federal decidiu reduzir o orçamento usado para gerenciar e reduzir riscos de desastres ambientais.
A verba federal que o governo reservou para bancar seu programa de gestão de riscos e desastres em 2025 prevê o repasse de R$ 1,7 bilhão para essa medida. Em 2024, esse orçamento foi de R$ 1,9 bilhão.
O programa tem espaço cativo na Lei Orçamentária Anual, que é o instrumento legal usado para estabelecer como vai ser aplicado o dinheiro público do país. A votação do Orçamento de 2025 deve ocorrer após o recesso parlamentar.
Isso significa que, no ano em que o Brasil vai sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima -a COP30, que será realizada em Belém em novembro- o governo decidiu reduzir em R$ 200 milhões o orçamento voltado para lidar com desastres.
Procurados, os ministérios envolvidos afirmaram que estão comprometidos com as ações na área.
As informações obtidas pela reportagem e compiladas pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) mostram um cenário de estrangulamento financeiro, situação que também foi corroborada pelo Congresso Nacional. As emendas parlamentares apresentadas ao projeto de Lei Orçamentária Anual de 2025 voltadas aos desastres climáticos caíram de R$ 69,9 milhões no ano anterior para apenas R$ 39,1 milhões.
Os valores aplicados pelo governo federal entre 2016 e 2024 mostram que uma média de R$ 2,3 bilhões foi injetada, anualmente, nesse programa (os dados do ano passado são até novembro). Há, na prática, um encolhimento de financiamento para essas ações.
A preocupação de especialistas com o enxugamento financeiro dessas ações está no fato de que esse programa do Orçamento não existe só para reagir a situações extremas, como as ocorridas em 2024, mas também para prevenir e preparar as regiões para possíveis calamidades.
Sem medidas preventivas ou preparação em andamento, o custo total da reação às tragédias climáticas pode ser explosivo. Foi o que ocorreu em 2024, quando o governo federal se viu forçado a autorizar uma série de créditos extraordinários, chegando a um volume recorde de R$ 6,9 bilhões.
"Vemos que houve redução, tanto do Executivo quanto do Legislativo. O que esses dados evidenciam é algo que já sabemos, que é a falta de prioridade do poder público para fazer o enfrentamento das mudanças do clima", diz Sheilla Dourado, assessora política do Inesc.
"Os recursos têm sido insuficientes, historicamente. São apenas para remediar situações, quando a gente precisa de prevenção para atacar não os efeitos, mas as causas dessas mudanças."
O Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), órgão ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que tem o objetivo de monitorar áreas de risco e emitir alertas de desastres naturais, atualizou neste ano a lista de municípios mais vulneráveis.
A fotografia mostra, por exemplo, que Bahia, Espírito Santo e Pernambuco concentram hoje 42,7% da população em áreas de risco de deslizamentos, enxurradas e inundações. Ainda assim, apenas Pernambuco recebeu emendas parlamentares destinadas ao programa: uma verba única de R$ 400 mil, para projetos de contenção de encostas em áreas urbanas.
O programa Gestão de Riscos e Desastres é coordenado pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, por meio da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, mas também conta com a participação das pastas das Cidades, Ciência e Tecnologia e Minas e Energia.
A reportagem procurou todos os ministérios citados. O da Integração declarou, por meio de nota, que "o volume de créditos extraordinários para 2025 vai depender dos fatores climáticos". "O governo federal tem se sensibilizado com os acontecimentos ocorridos e, sempre que possível, tem atendido aos pleitos do ministério", afirmou.
Minas e Energia declarou que é a pasta da Integração que "responde pelo alcance de seus objetivos gerais e específicos, bem como pela entrega dos resultados previstos", apesar de o ministério ter papel significativo em temas como segurança de barragens e infraestrutura energética.
O Ministério das Cidades afirmou que "reitera seu compromisso com a prevenção e mitigação de desastres em todo o território nacional" e que no âmbito das ações orçamentárias voltadas à drenagem urbana, manejo de águas pluviais e obras de contenção de encostas, a PLOA (Projeto de Lei Orçamentária) 2025 prevê R$ 658 milhões, um aumento em relação aos R$ 639 milhões alocados em 2024.
"É importante destacar que, sob o governo do presidente Lula, foram garantidos os maiores investimentos para ações preventivas, com R$ 15,8 bilhões destinados a obras de drenagem e R$ 1,7 bilhão para contenção de encostas. O ministério reforça que os investimentos em infraestrutura e planejamento seguem como prioridade para a promoção de cidades mais resilientes e seguras", afirmou.
O ministério da Ciência e Tecnologia respondeu que, ao menos na parte que trata de sua atuação no programa, por meio do Cemaden, não houve corte, e o órgão conseguiu incluir uma proposta de R$ 19,9 milhões para 2025. Em 2024, o Cemaden começou o ano com R$ 19,1 milhões, mas sofreu cortes e viu essa dotação cair para R$ 14,8 milhões.
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