O Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alerta para Desastres Naturais) afirma ter alertado o Governo de São Paulo cerca de 48 horas antes sobre o alto risco de desastre no litoral paulista.
Ao menos 48 pessoas morreram, sendo 47 em São Sebastião e 1 em Ubatuba - a última atualização foi feita nesta quarta (22) pela Defesa Civil.
Segundo o Cemaden, que é um órgão federal, a Defesa Civil estadual foi alertada sobre a ocorrência de chuvas fortes na região e o alto risco de desastres em uma reunião online na manhã de sexta (17).
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A vila do Sahy, o ponto em que mais pessoas morreram, foi citada como uma área de alto risco para deslizamento.
Em nota, a Defesa Civil diz que emitiu alertas preventivos à população desde que foi informada da previsão de fortes chuvas.
"Nós alertamos e avisamos a Defesa Civil na sexta, foram quase 48 horas antes de o desastre acontecer. Seguimos o protocolo que é estabelecido, alertando a Defesa Civil estadual para que ela se organizasse com os municípios", disse Osvaldo Moraes, presidente do Cemaden.
O Cemaden é ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. O centro é responsável por monitorar índices meteorológicos e geológicos e alertar, caso necessário, os órgãos de prevenção.
Moraes diz que, ainda na quinta-feira (16), um boletim meteorológico já indicava as fortes chuvas na região. Esse boletim foi repassado para a Defesa Civil do estado.
Depois desse primeiro alerta, o Cemaden se reuniu com um representante da Defesa Civil estadual na sexta de manhã. "Nós emitimos boletins diários, o de quinta já indicava o risco. Mas o de sexta-feira aumentou o nível de alerta para essa região."
A Defesa Civil disse que enviou 14 alertas de mensagem de texto (SMS) para mais de 34 mil celulares cadastrados na região do litoral norte. O órgão informou ainda que começou a articular ações as defesas civis municipais na quinta-feira quando recebeu a previsão de fortes chuvas na região.
"Os primeiros avisos divulgados pela Defesa Civil do Estado, que ocorreram ainda de forma preventiva, foram publicados por volta das 15 horas de quinta-feira, nas redes sociais da Defesa Civil e do Governo com informações sobre o volume de chuvas estimado para o período, bem como as medidas de segurança que poderiam ser adotadas pela população em áreas de risco", diz a nota.
O órgão disse ainda que à 00h52 de sexta, ao acompanhar imagens de radares e satélites, enviou a primeira mensagem de SMS com o alerta.
Nas redes sociais da Defesa Civil, a primeira mensagem de alertas para chuvas fortes no sábado foi feita às 12h22. A mensagem, no entanto, não fala sobre os riscos de desmoronamento.
Durante a noite, outros alertas foram postados pelo órgão e nenhum deles faz menção ao risco de desmoronamento de terra. Foi só às 19h49 uma mensagem recomendou que as pessoas deixassem o local se precisassem.
Para os especialistas, a proporção do desastre e o elevado número de vítimas mostram que apenas a estratégia de envio de SMS aos moradores não é eficiente. Além de não ser possível saber se as pessoas viram os alertas, não havia um plano ou orientação sobre o que fazer na situação.
"Você cria um sistema de aviso, as pessoas podem até receber a mensagem, mas não sabem o que fazer com aquela informação. Não há uma orientação para onde devem ir, quando sair de casa, o que levar", diz Eduardo Mario Mendiondo, coordenador científico do Ceped (Centro de Estudos e Pesquisas sobre Desastres) da USP.
Para ele, a estratégias devem pensar também criação de rotas de fugas em áreas de risco e na orientação aos moradores. "A população precisa saber qual o risco está correndo e como se proteger. É injusto depois dizer que eles não queriam sair de casa, eles não tinham orientação correta do que fazer."
Segundo ele, em diversas cidades do país, como Petrópolis e Salvador, o alerta ocorre por uma sirene.
"Você garante que todo mundo vai ouvir a qualquer momento do dia. É o instrumento mais antigo, mas que funciona. Uma sirene dá o recado claro do risco iminente", diz.
Para Fernando Rocha Nogueira, coordenador do LabGRIS (Laboratório Gestão de Riscos) da UFABC, as autoridade brasileiras assistem de forma inerte aos desastres que ocorrem no país. Segundo ele, o Brasil conta com bons sistemas de monitoramento, mas não desenvolve estratégias para proteger a população.
"Temos um problema grave de comunicação no país. Tinha o mapeamento de que iria chover muito, que havia um alto risco e não se deu a atenção devida. Milhares de pessoas desceram para o litoral, ignorando a previsão. Nós não temos conscientização do risco, nós vivemos um negacionismo das informações climáticas", diz.
COMO FORAM OS AVISOS
Quinta-feira (16)
Boletim do Cemaden alerta para a ocorrência de chuvas fortes e volumosas no litoral paulista durante o Carnaval.
Sexta-feira (17)
Em reunião virtual, o Cemaden faz alerta sobre a previsão de chuvas fortes e o risco de deslizamentos de terra para integrantes da Defesa Civil do estado. A vila do Sahy estava entre as áreas apontadas como de maior risco.
Sábado (18)
12h22: Defesa Civil do Estado avisa nas redes sociais que a chuva estava se espalhando pela região de Ubatuba e Caraguatatuba. "Tem vento e raios. Atinge municípios vizinhos. Tenha cuidado nas próximas horas", diz a mensagem
18h33: Uma nova mensagem da Defesa Civil é postada alertando para chuva persistente na região.
19h49: Outra mensagem é postada pela Defesa Civil diz que a "chuva está se espalhando" pelo Litoral Norte e pede para que as pessoas "tenham cuidado nas próximas horas".
23h13: A Defesa Civil alerta que a chuva persiste na região e recomenda "não enfrente alagamentos. Fique atento a inclinação de muros e a rachaduras. Se precisar saia do local".
03h15: O órgão volta a alerta sobre a chuva forte e persistente no litoral norte e diz "não enfrente alagamentos. Fique atento a inclinação de muros e a rachaduras. Se precisar saia do local."