As cotas políticas e eleitorais para estímulo à participação de mulheres e negros na política começaram nos anos 90, por iniciativa do Congresso, e, de 2018 a 2020, ganharam impulso por meio de decisões do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e STF (Supremo Tribunal Federal).
Leia mais:
Todos que participaram da delação correm risco, diz ex-advogado de empresário morto
Caixa relança campanha histórica dos "Poupançudos" para reforçar crédito imobiliário
Por erro em divisa, Paraná pode perder território para Santa Catarina
Meta climática do Brasil cita pela 1ª vez redução no uso de combustíveis fósseis
Em linhas gerais, os tribunais afirmam ter interpretado a Constituição e agido devido à omissão legislativa nesse sentido.
Essas decisões da Justiça sempre foram criticadas pelos dirigentes partidários, que argumentam caber ao Congresso legislar sobre o tema. Além disso, dizem ser difícil encontrar mulheres e negros em número suficiente para disputarem eleições.
Esse embate entre Justiça e Congresso é uma das motivações da PEC da Anistia aprovada nesta quinta-feira (11) pela Câmara dos Deputados.
A medida foi uma resposta ao STF, que determinou em 2022 a aplicação de recursos nas candidaturas de pretos e pardos em valor proporcional ao número de candidatos.
A maior parte dos partidos descumpriu essa determinação e passou a tentar aprovar no Congresso anistia às punições resultantes do julgamento das prestações de contas.
A primeira cota de gênero no Brasil surgiu em 1995, quando o Congresso aprovou a destinação às mulheres de ao menos 20% das candidaturas nas eleições municipais do ano seguinte. Em 2000, esse percentual subiu para 30%.
Em 2018, o TSE e o STF decidiram que os partidos deveriam também repassar as bilionárias verbas dos fundos partidário e eleitoral de forma proporcional ao número de candidatas.
Como revelou a Folha de S.Paulo, isso impulsionou o fenômeno das chamadas candidaturas laranjas, fraude que consiste no lançamento de campanhas de fachada apenas com o intuito de desvio das verbas femininas para candidatos homens.
Um dos partidos que registraram laranjas foi o PSL (hoje União Brasil), partido pelo qual Jair Bolsonaro (PL) se elegeu presidente da República.
Em 2020, a Justiça estendeu a regra de proporcionalidade na verba para as candidaturas negras.
Apesar das cotas, a participação de mulheres e negros na política ainda é minoritária, embora tenha crescido nos últimos anos.
A Câmara dos Deputados é um exemplo. Ela é dominada por homens brancos, tanto nos cargos de comando como na quantidade geral.
Na eleição de 2022, apenas 18% das 513 cadeiras foram conquistadas por mulheres, apesar de elas serem 51,5% da população (Censo de 2022). No final dos anos 90 as mulheres representavam apenas 5% dos parlamentares na Câmara.
Já pretos e pardos representaram 26% dos 513 deputados eleitos em 2022, apesar de serem 55,5% na população brasileira.
Oito anos antes, em 2014, quando o TSE passou a divulgar a autodeclaração de raça dos candidatos, os negros eleitos para a Câmara somavam 20% das cadeiras.
A PEC da Anistia aprovada na Câmara e que segue agora para o Senado revoga a determinação de que negros devem receber verba eleitoral de forma proporcional ao número de candidatos -em 2022, pretos e pardos somaram 50,27% das candidaturas-, concede perdão a irregularidades e abre ainda um generoso e perpétuo programa de refinanciamento de débitos aos atuais 29 partidos políticos.
Pela medida, a verba eleitoral e partidária aos políticos pretos e pardos será de 30%.
Cronologia das cotas de gênero e raça na política
1995
- Gênero: Lei 9.100/95 estabelece que ao menos 20% das candidaturas a vereador na eleição de 1996 deveriam ser de mulheres
- Quem tomou a decisão: Congresso
1997
- Gênero: Lei das Eleições (9.504/1997) obriga os partidos a reservar na disputa à Câmara dos Deputados e às Assembleias estaduais ao menos 25% das vagas para candidaturas de mulheres. Muitos partidos, porém, deixaram essas vagas em branco.
- Quem tomou a decisão? Congresso
2000
- Gênero: A cota de candidaturas sobe para 30%
- Quem tomou a decisão: Congresso
2009
- Gênero: Lei 12.034 acaba com a brecha de deixar vagas sem preencher e obriga os partidos a, efetivamente, lançar um mínimo de 30% de candidatas. Estabelece também que os partidos deverão aplicar ao menos 5% do Fundo Partidário (e 10% da propaganda) na promoção da participação política das mulheres
- Quem tomou a decisão: Congresso
2018
- Gênero: Partidos passam a ser obrigados a repassar às mulheres tempo de propaganda e verba de campanha proporcional ao número de candidatas -ou seja, ao menos 30%
- Quem tomou a decisão: TSE e STF
2020
- Raça/cor: Partidos passam a ser obrigados a distribuir a propaganda e a verba de campanha proporcionalmente ao número de candidatos brancos e negros que lançar
- Quem tomou a decisão: TSE e STF
2021
- Gênero e raça/cor: Votos dados a mulheres e negros nas eleições de 2022 a 2030 passam a contar em dobro para efeito da distribuição dos recursos dos fundos partidário e eleitoral
- Quem tomou a decisão: Congresso
2022
- Gênero: Lei 14.291 estabelece que a propaganda partidária terá que destinar ao menos 30% à promoção da participação política das mulheres. PEC 117 coloca na Constituição a exigência de aplicação mínima de 5% das verbas na promoção da participação das mulheres e também a obrigação de distribuição proporcional às candidatas de verbas e propaganda
- Quem tomou a decisão: Congresso
2024
- Aprovada a PEC da Anistia, que reduz a verba eleitoral a negros de cerca de 50% para 30%
- Quem tomou a decisão: Câmara