Entre janeiro e junho de 2024, o MFB (Monitor de Feminicídios no Brasil), mantido pelo Lesfem (Laboratório de Estudos de Feminicídios no Brasil), identificou a ocorrência de 905 casos de feminicídios consumados no país e outros 1.102 feminicídios tentados.
As médias diárias foram, respectivamente, 4,98 e 6,05, índices alarmantes que reiteram: o contexto doméstico no Brasil é um lugar de risco para as mulheres.
A fonte de dados do MFB são notícias publicadas em portais na internet, identificadas a partir de busca ativa e de ferramenta digital desenvolvida pelo Data + Feminism Lab do MIT (Massachusetts Institute of Technology).
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A metodologia para classificação segue as definições das Diretrizes Nacionais para Investigar, Processar e Julgar com Perspectiva de Gênero as Mortes Violentas de Mulheres e do Mapa Latino-americano de Feminicídios.
As pesquisadoras e pesquisadores do laboratório destacam que, embora nas últimas décadas tenha havido a ampliação de políticas públicas acerca da violência doméstica, como a Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006) e a própria Lei do Feminicídio (Lei n. 13.104/2015), o agravamento do número de casos e de outras violências de gênero revela a urgência de novas estratégias.
“É certo que muitos feminicídios não são classificados ou reportados como tal. Essa invisibilização passa por diferentes segmentos da sociedade, como a educação, saúde, assistência social, segurança pública e justiça”, explica Silvana Mariano, doutora em sociologia, docente da UEL (Universidade Estadual de Londrina) e coordenadora do Lesfem.
FEMINICÍDIOS TENTADOS
O Lesfem tem especial atenção para os casos de feminicídios tentados, em contraponto ao que se observa nas instituições, organizações e veículos de imprensa, nos quais a abordagem do fenômeno tende a observar mais os feminicídios consumados.
“A relevância do registro e atenção para os dados referentes aos feminicídios tentados é justificada pelo próprio impacto negativo que causa na vida das mulheres, de suas famílias, da comunidade e no conjunto da sociedade”, destaca Silvana Mariano.
Esse registro também contribui para reflexões sobre a efetividade das MPU (Medidas Protetivas de Urgência) enquanto mecanismos de proteção à Violência Doméstica e Familiar Contra as Mulheres, conforme previsto na Lei Maria da Penha.
CLASSIFICAÇÃO DE FEMINICÍDIOS
Dentre os casos detectados pelo Lesfem, a maior parte se caracteriza como “feminicídio íntimo” (67,4% dos consumados e 77% dos tentados), aqueles em que o agressor faz parte do círculo de intimidade da vítima, como, por exemplo, companheiro e ex-companheiro.
Na sequência, aparecem casos de “feminicídio não íntimo” (10,7% dos consumados e 5,2% dos tentados), correspondendo à violência contra a mulher que é cometida por um homem desconhecido, com o qual a vítima não possuía nenhum tipo de relação ou vínculo.
O “feminicídio familiar”, aquele identificado pela relação de parentesco entre vítima e agressor corresponde a 7,2% dos casos consumados e 6,8% dos tentados.
O Lesfem elenca, ainda, casos de feminicídios por conexão, feminicídios por crime organizado, dentre outros. As classificações têm como base as tipologias estabelecidas pelo Modelo de Protocolo Latino-americano.
“Cabe-nos argumentar, também, sobre o fato de que a construção de dados sobre feminicídios no Brasil tem se deparado com grandes desafios em relação a essas caracterizações dos feminicídios. Constatamos uma resistência das autoridades em adotar os protocolos e diretrizes que orientam a hipótese de feminicídio em processos investigativos que dizem respeito, por exemplo, a casos de transfeminicídios. Eles correm o risco de serem rejeitados como tal pela própria dificuldade de compreensão das questões relativas à identidade de gênero e orientação sexual”, argumenta a coordenadora do Lesfem.
PREVALÊNCIA NOS ESTADOS
O Lesfem apurou a taxa de feminicídios consumados e tentados por 100.000 mulheres por Unidade da Federação, no período de janeiro a junho de 2024. Nesse caso, a taxa média no país é de 1.03 e dentre os 27 Estados, 11 estão acima da média nacional.
A taxa mais alta é a registrada pelo Mato Grosso do Sul (2 casos para cada 100 mil mulheres), mesmo cenário detectado ao longo de 2023. Na sequência aparecem Mato Grosso (1.65), Amazonas (1.52), Espírito Santo (1.48) e Acre (1.45).
PARANÁ
Em números absolutos, o Paraná é o segundo estado do país com maior registro de feminicídios no primeiro semestre de 2024, num total de 168 ocorrências, sendo 69 consumados e 99 tentados.
Os municípios com maiores registros, em números absolutos, são Curitiba (12), Cascavel e Toledo (7 cada), Araucária (6) e Apucarana (4). Em Londrina foram detectados dois casos no semestre, sendo um feminicídio tentado e outro consumado.