O Brasil terminou o ano de 2019 com 318 mil km² de área florestal consumidas pelo fogo, segundo dados do Programa de Queimadas, do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). O número é quase o dobro do registrado no ano anterior: 86% maior do que o de 2018 (170 mil km²).
O ano passado foi o primeiro em que o INPE verificou aumento de área queimada em todos os seis biomas medidos na comparação com o período anterior -os dados começaram a ser disponibilizados em 2002.
A área queimada em 2019 é equivalente a 44,5 milhões de campos de futebol, e é quase 10% maior que a soma dos territórios dos estados de Rio de Janeiro e São Paulo. O total atingido pelo fogo em 2019 é o terceiro maior da década, atrás apenas de 2012 (391 mil km²) e 2015 (354 mil km²).
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Área queimada por bioma em 2019:
Pantanal - 20.835 km² (alta de 573% em comparação a 2018)
Pampa - 1.398 km² (alta de 127% em comparação a 2018)
Caatinga - 55.536 km² (alta de 118% em comparação a 2018)
Cerrado - 148.648 km² (alta de 74% em comparação a 2018)
Amazônia - 72.501 km² (alta de 68% em comparação a 2018)
Mata Atlântica - 19.471 km² (alta de 46% em comparação a 2018)
Pantanal - O maior aumento em área queimada dos biomas ocorreu no Pantanal, onde 20,8 mil km² foram atingidos pelo fogo, 573% a mais que em 2018.
Ao todo, no ano passado, 13,9% do território do bioma foi atingido por incêndios, maior índice em 15 anos. Em setembro passado, os estados de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul decretaram emergência por conta da quantidade de focos.
O aumento exponencial de área atingida por queimadas no Pantanal tem alguns fatores como motivadores, explica André Luiz Siqueira, diretor-presidente da ONG (Organização Não Governamental) Ecoa: "Temos de levar em conta que tivemos um ano muito seco por aqui, tanto que tivemos queimadas antes do tempo e que foram até o início de dezembro –o que é atípico e dois meses a mais que a média."
"Outro fator é que o Pantanal está na fronteira com a Bolívia, que queimou muito em 2019." No ano passado, a Bolívia registrou 44.271 focos de queimadas, o maior número desde 2010, conforme dados do Inpe. "Desde 2018, o Brasil perdeu a capacidade de negociação com a Bolívia, deixando de acordar intercâmbios e cooperações. Isso tudo foi fundamental", explica.
Segundo Siqueira, também houve uma falta de resposta dos órgãos públicos no combate ao fogo. "Por exemplo: o estado do Mato Grosso do Sul não tinha aparelhagem para combater o fogo. Inclusive precisou receber doações para as operações. A última grande queimada aqui ocorreu há 15 anos, e nós tivemos praticamente o mesmo percentual queimado daquele ano", diz.
Outros biomas - Os outros cinco biomas medidos pelo INPE também tiveram alta em 2019. A maior área queimada em termos absolutos é o Cerrado, onde 148 mil km² foram atingidos pelo fogo: 74% a mais que em 2018. Por conta de sua característica mais seca e de fogo com autopropulsão, o bioma é, historicamente, o que apresenta o maior número de focos e área queimada no país.
Já na Amazônia, a alta foi de 68% em relação a 2018, com um total de 72,5 mil km² devastados pelo fogo.
O percentual chama atenção porque é mais que o dobro da alta de focos de queimadas registrados em 2019, que foram apenas 30% maiores que em 2018. Isso mostra que os focos em 2019 foram maiores em área queimada.
"Nova política ambiental" - A reportagem procurou especialistas, que apontaram fatores para o crescimento. Para o biólogo Rômulo Batista, da campanha de Amazônia do Greenpeace, a extensão da área queimada chama a atenção porque 2019 não foi um ano de fenômenos climáticos El Niño ou La Ninã.
"Eles causam secas mais fortes no norte ou no sul do País. O que tivemos de novidade foi a nova política ambiental, ou, na verdade, a ausência de uma política ambiental desde que o governo assumiu", diz.
Batista afirma ainda que o aumento em todos os biomas é fruto de uma "falta de política ambiental de combate às queimadas e ao desmatamento, além da redução do orçamento para o MMA [Ministério do Meio Ambiente] e o principais órgãos que coíbem o desmatamento e as queimadas".
Cássio Bernardino, analista de Conservação do WWF-Brasil, diz que a grande maioria das queimadas teve origem proposital do homem. "Esses incêndios têm origem especialmente antrópica [ação do ser humano]. Mesmo nos biomas onde é natural a ocorrência de fogo, esses números não eram esperados. E as análises espaciais mostram o fogo predominantemente às margens de rodovias e próximo a centros urbanos, o que indica que elas são de origem humana, principalmente para ações desmatamento e reforma de pastagem", explica.
Ainda segundo Bernardino, todos os biomas tiveram área queimada acima das médias históricas, e a culpa disso estaria ligada ao discurso e à falta de ações do governo federal.
"Houve uma retórica governamental, uma mensagem de que o meio ambiente é um recurso que pode ser explorado de qualquer forma, e que a proteção pode ser uma ameaça o desenvolvimento. De outro lado, tivemos menos ênfase nos mecanismos de sistema de comando o controle. Tivemos mesmo fiscalização e menos equipes em campo", aponta.
Procurado ontem para comentar o aumento de áreas queimadas nos seis biomas em 2019, o MMA não enviou resposta à reportagem.